O ano de 1969 preencheu muitas páginas nos livros de história. Marcou o fim de uma década tumultuada, definida pela revolução cultural e revolta social.
Avançando um pouco mais, descobriremos que 1971 também não foi um período calmo. A Disney World foi inaugurada, o McDonald’s introduziu o Quarteirão com queijo, a NPR fez sua primeira transmissão e a Barbie foi para Malibu. Nike Swoosh, Amtrak, FedEx, NASDAQ e Starbucks fizeram a sua estreia. Greenpeace e Médicos Sem Fronteiras foram fundados para responder às crises humanitárias no mundo todo. Os Emirados Árabes Unidos declararam sua independência, as mulheres suíças ganharam o direito de votar e a Suprema Corte dos EUA adotou o transporte escolar como uma abordagem constitucional para integrar escolas. O campo da tecnologia testemunhou a invenção da calculadora de bolso, dos disquetes e do microprocessador comercial. Não esqueçamos do e-mail.
O ano de 1971 também presenciou uma série de avanços médicos que melhoraram a vida de milhares de pessoas, desde exames de TC e lentes de contato macias até a vacina tríplice viral. Um produto discretamente ambicioso chamado Co/Struc surgiu na mesma época, projetado especificamente para o setor médico. Concebido pelo pesquisador Robert Propst com a ajuda do designer industrial Jack Kelley, o Co/Struc deixou sua marca no setor de saúde, melhorando a vida profissional de todos em instalações de atendimento a pacientes.
“Áreas de inadequação e falha graves”
Voltemos para o final da década de 1950. O presidente da Herman Miller, D.J. De Pree estava procurando expandir o portfólio da empresa após o sucesso dos produtos projetados por Charles e Ray Eames, Alexander Girard e George Nelson. Basicamente, o ganha pão da empresa eram as cadeiras, mas De Pree não queria depender de uma única categoria de produto no caso de uma queda nas vendas.
O encontro casual de De Pree com um personagem excêntrico chamado Robert Propst quando participava da Conferência Internacional de Design de 1958 em Aspen, Colorado, levou a Herman Miller a explorar outras áreas diferentes da dos assentos. Propst era curioso por natureza, antenado no que era realmente inovador. Autointitulado “pesquisador”, era conhecido por sua busca incansável em resolver problemas e intolerância pela perda de tempo e ineficiência. De Pree acabou nomeando Propst como diretor da recém-formada entidade Herman Miller Research Division (HMRD) em Ann Arbor, Michigan, para explorar melhor seu ponto de vista.
A HMRD explorou vários campos de pesquisa, incluindo, mas certamente não se limitando a móveis. Nos primeiros dez anos, Propst e sua equipe embarcaram em cerca de 30 projetos, um dos quais estudou a produtividade humana , resultando no desenvolvimento do Action Office.
Em 1960, Propst teve hérnia de disco na coluna e foi parar no Hospital Universitário de Ann Arbor. Confinado em um quarto de hospital, Propst (óbvio!) não conseguia controlar sua mente inquieta. Ele se autodenominou etnógrafo líder e tomou nota de tudo o que viu relacionado às funções do hospital, observando de perto como as pessoas se moviam e trabalhavam. Evidentemente, a equipe do hospital ficou nervosa e desconfiada ao ver uma pessoa anotando todos os movimentos sem explicação. Mas a estadia de Propst como paciente seria uma das melhores coisas que aconteceria aos médicos e à equipe do hospital.
Propst voltou ao seu departamento de pesquisa pensando nos hospitais , especificamente nas “áreas de inadequação e falha graves”. O Hospital Universitário acabou se tornando um parceiro de pesquisa para as ideias e conceitos de Propst. Ele vendeu à administração do hospital os benefícios dos componentes do Co/Struc que estavam em desenvolvimento: projetos para armários, carrinhos e sistemas de comunicação. Mas antes ele só precisava convencer a administração da Herman Miller a assumir o risco e entrar na área da saúde.
O primeiro indicativo do potencial da pesquisa de Propst, o Action Office (ou “AO1”), chegou ao mercado em 1964. O design foi ajustado posteriormente e evoluiu para o mais bem-sucedido AO2 em 1968. Com esse sucesso, veio a descoberta de que seus componentes podiam ser aplicados a uma variedade de ambientes, principalmente por causa de sua modularidade e adaptabilidade. Mais tarde, a empresa voltou a desenvolver o Co/Struc, que estreou oficialmente em 1971 e lançou a Herman Miller no mercado da saúde.
“Não há nada igual”
Em sua forma mais simples, o Co/Struc é um sistema de contêineres, estruturas, carrinhos e trilhos. Foi o primeiro exemplo de um sistema móvel e modular projetado especificamente para ambientes da área de saúde. Segundo Propst, sua modularidade pretendia “resolver vários problemas inter-relacionados com elementos que produzem resultados melhores e influenciam por seu impacto coletivo”.
Durante seu tempo à frente da divisão de pesquisa, Propst estabeleceu nove critérios que formaram a base para o Action Office e o Co/Struc. Esses nove critérios não apenas permitem a adaptabilidade, mas também fornecem uma base teórica para o sucesso desses produtos, tornando o Co/Struc difícil de reproduzir sem considerar seus princípios.
Os nove critérios de Propst
- Indulgência: soluções que permitem mudanças
- Coerência: soluções com elementos que funcionam em conjunto e se integram com outros sistemas
- Encaminhamento de processos: soluções que facilitam e tornam intuitiva a execução de tarefas
- Modularidade limitada: soluções que requerem mínimos componentes, mas com função e capacidade máximas
- Adaptabilidade: soluções que respondem a novas situações e necessidades sem interromper a continuidade visual
- Disponibilidade: soluções que continuam a fornecer o que é necessário e quando é necessário ao longo do tempo
- Substituível: soluções com componentes fáceis de desmontar e aprimorar sem perder o investimento inicial
- Progressivamente editável: soluções que podem ser atualizadas no ritmo desejado
- Renovação de instalações : soluções que ajudam a converter instalações existentes para novos usos e/ou implantar novos recursos em uma instalação
Para colocar um hospital nos padrões de Propst, o Co/Struc precisava resolver seis áreas principais de problemas: sanitização, obsolescência e falha, serviço personalizado, transporte e abastecimento, uso humano e estética. Depois, aplicavam-se os nove critérios universais para criar o sistema certo do qual as instalações de saúde se beneficiariam.
Quanto à sanitização, os materiais tradicionais usados para a mobília (e a forma como eram montados) tornavam a maioria dos móveis (como a estrutura da cama em madeira) difícil, senão impossível de higienizar usando “procedimentos razoáveis e rotineiros”. O Co/Struc é separável, perfeito, sem cantos e drenável. Todas as superfícies, bem como os componentes individuais que podem ser levantados e pendurados na parede, foram produzidos para facilitar a limpeza. As estruturas e carrinhos de coleta de lixo também são laváveis. “Nós enfermeiras, ficamos em êxtase”, relata Janet Ziegler, enfermeira líder aposentada, RN, MN, MBA e EDAC. “Fácil de limpar, organizar e mover ... Uau!”
Em sua essência, cada elemento do Co/Struc é fácil de usar e não requer um treinamento extenso para reconfigurar, o que acontece com bastante frequência, considerando que cada paciente, médico e departamento clínico tem necessidades diferentes. Os equipamentos embutidos de tamanho único são inflexíveis por natureza. O Co/Struc resolve esse problema com sua adaptabilidade intrínseca: os componentes podem ser reconfigurados e reajustados para atender a uma variedade de necessidades. Por exemplo, os trilhos são ajustáveis na altura e podem ser montados em paredes. Da mesma forma, os carrinhos fornecem um lugar para cabides móveis.
“Este produto pode ser levado para qualquer lugar de um hospital”, explica Jim Wright, o agora gerente de vendas aposentado da área de saúde da Herman Miller. “Se não precisavam de um armário na sala de cirurgia, esse mesmo componente podia ir para outro andar e ser usado no pronto-socorro . [Não era necessário] muito dinheiro para fazer as mudanças. ”O Co/Struc acabou entrando também em laboratórios, farmácias e escritórios administrativos.
Componentes que podem ser removidos e substituídos individualmente também eliminam a inevitável obsolescência. Os ambientes da área de saúde são conhecidos pelas mudanças constantes, o que significa que os equipamentos se tornam desatualizados e menos atraentes muito antes de falharem. “Ninguém tinha nada parecido ... Eu poderia pegar um gaveteiro em formato de C e, se estragasse, o cliente poderia substituí-lo”, diz Wright. “Essa foi a missão [de Propst]: um verdadeiro sistema.”
Também há a questão da oferta e da demanda. Os hospitais podem precisar de entregas rápidas, e as equipes em movimento inevitavelmente terão urgência de certos materiais. Propst planejou o sistema Co/Struc para controlar o ciclo completo de gerenciamento de materiais. Os gaveteiros e carrinhos podem ser usados como contêineres de transporte e carregados com suprimentos para serem distribuídos onde for necessário.
Fundamentalmente, o Co/Struc foi projetado levando em consideração a estética: um design claro e limpo com gaveteiros disponíveis em uma paleta de cores para um apelo visual (beleza) e codificação de cores (utilidade). A questão do lixo e da roupa de cama suja não é apenas um problema de sanitização, ela pode produzir uma imagem assustadora. O Co/Struc forneceu contêineres fechados atraentes e estruturas de cabide para armazenar itens contaminados. Propst usou o termo “esquizofrenia visual” para descrever o ambiente hospitalar comum , porque não havia um espaço que fosse atraente para os pacientes e alojasse todas as funções técnicas e de serviço.
Como um todo, o Co/Struc introduziu um novo padrão de desempenho para os móveis da área de saúde: Atraente. Higienizável. Lavável. Separável. Substituível. Empilhável. Portátil. Acolchoado para absorver o impacto.
Quem não arrisca não petisca
A Herman Miller teve um aumento acentuado em sua receita no final dos anos 60 e 70 devido ao sucesso do Action Office e do Co/Struc. A transformação de uma empresa de objetos em uma empresa de sistemas elevou as vendas de US$ 20 milhões para mais de US$ 230 milhões. Foi um grande sucesso , e não teria sido possível sem a confiança da Herman Miller em Propst, assumindo um risco ambicioso.
“Propst sugeriu que visitássemos os hospitais, pois não tínhamos experiência e nada sabíamos”, diz Joe Schwartz, que supervisionou o departamento de marketing e vendas da Herman Miller de 1954 a 1986. “Mas Propst era um comunicador muito eficaz, então ele conseguiu permissão para continuar trabalhando no desenvolvimento e na pesquisa”.
E valeu a pena.
Ficamos atordoados ao pensar em todas as mudanças no último ano, quanto mais nos últimos 50. O ano de 1971 foi o início de uma corrida em termos de novas tecnologias que transformaram a maneira como as pessoas e as indústrias funcionam. Durante essa era de mudanças, o Co/Struc tem sido uma constante. Seus princípios de design, radicalmente diferentes quando Propst os concebeu pela primeira vez, mantiveram seu espírito moderno. A modularidade e a reconfigurabilidade do sistema sustentaram sua relevância. Com pequenos ajustes e iterações ao longo do tempo, o sistema ainda está em uso e é demandado por profissionais de saúde até hoje.
“Quando se executa a melhoria contínua, precisamos de um ambiente que possa suportar facilmente a mudanças contínuas”, diz Roger Call, que encerrou sua carreira de 35 anos na Herman Miller em 2020 como Diretor de Arquitetura e Design da Área de Saúde. “Que por acaso, é a essência do Action Office e do Co/Struc, graças a Bob Propst. Como nossos clientes estão passando por mudanças contínuas, eles valorizam a capacidade de refazer, reconfigurar e reaproveitar as instalações. ”
Observações
1. Herman Miller, Co/Struc: sistema de estruturas coerentes para hospitais, Herman Miller, Inc. 1967
2. Herman Miller, Estudo de solução: vidas simples em configurações adaptáveis, https://www.hermanmiller.com/content/dam/hermanmiller/documents/solution_essays/se_lean_lives_in_adaptive_settings.pdf. 2016, 4-6